quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Choque de dois Mundos: Montezuma II e Cortez

Encontro entre Montezuma II e Cortez
Estive a estudar intensamente o Porto e Portugal quinhentistas, bem como a perda da independência nacional, sob o domínio de Filipe II: detectei - tanto no passado distante como no presente próximo - a mesma onda de deslumbramento em acção que nos lança sempre na fossa. Estou cansado de Portugal e da sua triste história: a eterna repetição da loucura e dos mesmos erros. Prefiro a magia de outras culturas, de outras terras, de outros países. Portugal não tem encanto. E, por isso, resolvi regressar às civilizações pré-colombianas para amaldiçoar Fernando Cortez (ou Hernán Cortés). Os portugueses nunca foram confrontados com mundos civilizados dotados de cultura superior à sua: coube aos espanhóis descobrir e destruir as grandes civilizações pré-colombianas. Quatro dias depois de ter entrado na capital do Império Asteca, Tenochtitlán, a 12 de Novembro de 1519, Hernán Cortés - na companhia de Motecuzoma II - foi visitar o mercado e o templo de Tlatelolco, donde avistou o aspecto geral de toda a grande cidade, subúrbios e arredores: a beleza da cidade, das suas ruas principais e dos seus edifícios, dos seus jardins e das suas estradas, dos seus canais e do seu aqueduto, cativou-o de tal modo que enviou uma carta a Carlos V, onde afirma que os índios «vivem quase como na Espanha e com tanta ordem quanto nela». De facto, nenhuma cidade de Espanha merecia ser comparada com Tenochtitlán, e, talvez apercebendo-se disso, Cortés compara-a com outras grandes cidades do mundo: «Havia entre nós soldados que estiveram em várias partes do mundo, em Constantinopla, em toda a Itália e em Roma, e eles disseram que jamais tinham visto um mercado tão bem organizado e ordenado, tão grande, tão repleto de gente». Tenochtitlán era uma vasta aglomeração urbana, que, espalhando-se pelas margens do lago, englobava no centro do vale mais de um milhão de almas. Em vez de tentar esboçar uma descrição da bela cidade lacustre do México, tarefa que levarei a cabo num outro texto, prefiro dar a palavra a Díaz del Castillo: «Para as refeições do grande Montezuma, os cozinheiros preparavam até trinta tipos de guisado... Quatro mulheres muito bonitas e muito limpas estendiam-lhe uma espécie de gomil... De vez em quando, traziam-lhe taças de ouro fino com chocolate... Haveria tantas coisas para descrever que não sei por onde começar, mas posso perfeitamente dizer que estávamos muito espantados perante a ordem e a abundância que reinavam em tudo». A seguir Díaz del Castillo descreve os edifícios reais: «Motezuma dispunha de um edifício especial para armazenar as suas armas, de que existia uma grande quantidade, a maior parte das quais ornamentada com ouro e pedrarias. Outra construção era reservada aos pássaros... em outro edifício viviam animais selvagens, jaguares, leões, chacais, raposas na companhia de numerosos ídolos... O grande Motezuma dispunha de um grande número de dançarinos e malabaristas... Há que falar também dos talhadores de pedra, dos pedreiros e marceneiros... sem esquecer os numerosos jardineiros que mantinham jardins repletos de árvores odoríferas e de flores». O luxo da Corte de Motezucoma reflecte, como é evidente, uma evolução do poder para a teocracia. Porém, o que mais impressionou os conquistadores foi, além da ordem e da abundância que reinavam nos domínios do grande Motecuzoma II, a sua riqueza banhada de ouro. Mas esta cobiça pelo ouro não os impediu de reconhecer o esplendor da cidade do México, descrita como «uma cidade digna do livro de Amadis», «uma praça três vezes maior do que a de Salamanca» ou «uma cidade mais bela do que Granada ou Veneza». Tal como os gregos e os romanos, os astecas tinham consciência do valor da sua cultura e da sua superioridade sobre os restantes povos índios. Com excepção de certas tribos da costa do golfo que tinham alcançado um nível de desenvolvimento cultural equivalente ao seu, os astecas da época clássica - entre 1430 e 1520 - opunham a sua civilização à barbárie, conscientes de que o seu povo tinha partilhado - algures no passado próximo - com os bárbaros um estilo de vida arcaico e primitivo que superou quando se tornou herdeiro das antigas civilizações do planalto (Tula e Teotihuacán), onde fundou a cidade do México, a capital de um vasto império em expansão.

Quando chegou a uma das Ilhas Bahamas, a 12 de Outubro de 1492, Cristóvão Colombo estava convencido de ter descoberto a Índia. Os espanhóis começaram por ocupar as ilhas de S. Domingos, Porto Rico e Cuba. A costa sul-americana e a costa da América Central só foram descobertas no início do século XVI. Em 1513, Nuñez de Baldoa atravessou o istmo e avistou o oceano Pacífico, o chamado "mar do Sul". Ninguém suspeitava da existência do México. Em 1502, Cristóvão Colombo passou ao largo de Yucatán, tendo encontrado uma canoa maia carregada de tecidos, cacau e machados de cobre, mas continuou a sua viagem sem ter explorado a costa mexicana. Porém, em 1522, uma caravela que fazia a rota do Golfo de Darien a São Domingos foi lançada por uma tempestade nas costas de Yucatán. Da sua tripulação sobreviveram ao naufrágio e ao cativeiro maia apenas dois espanhóis: Aguilar e Guerrero. Aguilar foi libertado por Cortez oito anos mais tarde, e Guerrero, casado com uma nobre maia, recusou auxiliar Cortez na conquista do México, tendo terminado os seus dias como cacique indígena. Em 1517, partiu de Cuba uma expedição com três navios, sob comando de Francisco Hernández de Córdoba. Embora tenham entrado em contacto com os maias de Yucatán e de Campeche, os espanhóis foram severamente repelidos e obrigados a reembarcar. Dos 110 homens que tinham partido para a descoberta, 57 morreram nessa aventura, incluindo o capitão. Os sobreviventes descreveram Yucatán - que pensavam ser uma ilha - como um mundo novo, mais povoado, rico e civilizado que as Antilhas. Em 1518, Juan de Grijalva, no comando de quatro navios, descobriu a ilha de Cozumel, costeou o litoral de Yucatán e, a seguir, o litoral do golfo do México. E, prosseguindo na rota de Tabasco até Tuxpan, deixou o território maia e entrou, pela primeira vez, em contacto com províncias do Império Asteca: os indígenas mexicanos foram amistosos e enviaram presentes aos espanhóis - objectos de ouro, pronunciando muitas vezes a palavra México, cujo sentido era ignorado pelos conquistadores. A 10 de Fevereiro de 1519 Fernando Cortez partiu de Cuba com 11 navios, levando consigo 508 soldados sem contar com os tripulantes, marinheiros e pilotos que eram 109, 16 cavalos e burros e 14 peças de artilharia. Cortez ouviu falar pela primeira vez de Motecuzoma II entre os maias do Tabasco: Díaz del Castillo conta que alguns soldados da primeira viagem realizada com Francisco Hernández de Cordoba ouviram os índios de Campeche gritar, ao vê-los: "Castelhanos!". Este facto que intrigou Cortez acabou por ser clarificado quando, em Yucatán, se encontrou com Jerónimo de Aguiar e Gonzalo Guerrero, dois espanhóis que viviam na região, «escravos dos caciques». A 15 de Maio de 1519 os caciques do Tabasco brindaram os espanhóis com presentes, dos quais o mais valioso foram vinte mulheres escravas: Cortez atribuiu uma mulher a cada capitão, tendo dado a mais bela, viva e desembaraçada a Puertocarero, cavaleiro e primo do conde de Medellin. Quando este partiu para Castela, Cortez ficou com Doña Marina. As origens da jovem índia não são bem conhecidas: o que se sabe é que ela era nobre e de origem nahuatl, refém dos maias. Doña Marina, que em nahuatl se chamava Malinnalli (Malinche), tornou-se companheira de Cortez, como se fosse o seu duplo, mãe do seu filho Don Martín Cortez, o primeiro mestiço a desempenhar um papel importante na história do México, e fiel colaboradora do conquistador. Do seu nome derivou o termo "malinchismo", cuja melhor tradução seria "colaboração". Mais tarde Motecuzoma II irá chamar a Cortez "Malinche" - "o que possui Malinnali". Para todos os efeitos, antes de empreender a marcha para a capital asteca, Cortez já dispunha de um duplo trunfo: Aguilar, que falava maia e espanhol, e Marina que, além de ter aprendido a falar espanhol, falava maia e nahuatl. Com efeito, quando chegou ao lugar da futura Veracruz em Abril de 1519, Cortez foi visitado pelo calpixqui asteca da província de Cuetlaxtlan, que, em nome de Motecuzoma II, lhe ofereceu víveres, magníficas e luxuosas peças de vestuário de algodão e plumas e jóias de ouro. Conversando com os senhores astecas através dos intérpretes Aguilar e Marina, Cortez tomou consciência da imensa riqueza do Império. Além disso, após ter sido recebido com entusiasmo pelos totonaques na sua capital Cempoala, Cortez descobriu que alguns povos submetidos ao Império odiavam mortalmente os astecas. Em Agosto de 1519, Cortez iniciou a sua marcha em direcção ao planalto Central, onde se situava a capital asteca, levando consigo 13 mil soldados e carregadores. Na fronteira de Tlaxcala, os espanhóis (2 de Setembro de 1519) depararam-se com a resistência feroz dos tlaxcaltecas e dos seus aliados, os otomi, mas depois de muitos dias de combate a aristocracia tlaxcalteca decidiu aliar-se aos poderosos estrangeiros contra o seu inimigo secular asteca. A partir desse momento a conquista do México tornou-se um empreendimento hispano-tlaxcalteca. A seguir a coluna espanhola reforçada pelos contingentes de Tlaxcala dirigiu-se para Cholula, onde massacrou 6 mil índios, e, depois de penetrar entre os vulcões, entrou no vale central. Cortez e a sua coluna passaram a noite em Iztapalapan numa residência senhorial e, no dia seguinte, atravessaram a passagem elevada que ligava a costa meridional à bela cidade lacustre, Tenochtitlán. Acompanhado pela sua corte, em especial pelo rei de Texcoco, Motecuzoma II recebeu Cortez à entrada da cidade, dirigindo-lhe estas palavras: «Senhor, estais esgotado, cansaste-vos bastante, eis-te agora no país (que é teu). Entrais finalmente na vossa cidade do México. Viésteis aqui para ocupardes o trono, sob o pálio real. Oh! durante um curto espaço conservaram-no, os que se foram embora, os vossos lugares-tenentes...» Díaz del Castillo descreve o receio que se apoderou dos astecas quando Cortez quis abraçar Motecuzoma II, depois de lhe ter oferecido um colar de missanga: «Os grandes senhores que acompanhavam Motezuma seguraram-lhe o braço para que não o abraçasse, porque consideravam isso como rebaixante». O próprio Cortez confirma isso na segunda carta enviada a Carlos V: «Tirei um colar de pérolas e diamantes de vidro que levava e coloquei-o no pescoço dele... fui abraçá-lo, e os dois senhores que iam com ele agarraram-me com as mãos para que não o tocasse». No dia 8 de Novembro de 1519, os conquistadores espanhóis instalaram-se no antigo palácio de Axayacatl e, com eles, uma estranha situação de angústia que duraria oito meses.

Isolados do mundo civilizado, os astecas não estavam preparados para travar uma guerra total com os espanhóis, até porque tinham uma concepção de guerra diferente da de Cortez. Motecuzoma II tornou-se virtualmente prisioneiro dos espanhóis, que, através dele, estabeleceram uma espécie de protectorado, com os seus aliados tlaxcaltecas prontos a aproveitar todas as ocasiões para exteriorizar o seu ódio contra os astecas. As tensões entre espanhóis e astecas aumentavam de dia para dia: os conquistadores opunham-se ao culto dos deuses astecas e apoderavam-se de todos os objectos de ouro, enquanto os tlaxcaltecas pilhavam jades e plumas preciosas. Entretanto, Cortez teve de abandonar apressadamente a cidade do México, deixando lá apenas alguns homens chefiados por Pedro de Alvarado, futuro conquistador da Guatemala, para regressar ao litoral, onde travou um combate com o seu rival Panfilo de Narvaez, enviado pelo governador de Cuba, Diego Velázquez, para o chamar à ordem ou o prender. Cortez derrotou rapidamente Narvaez e atraiu os seus soldados para a conquista do México. Mas, enquanto Cortez lutava com Narvaez, Motecuzoma II pediu aos conquistadores - talvez a Alvarado - que lhe concedessem o direito de celebrar a festa de Huitzilopochtli. Alvarado era tão louro e belo que os índios lhe chamavam Tonatiuh, "Sol". Porém, Alvarado tomou a decisão de massacrar a multidão - em especial os membros da nobreza guerreira asteca - que celebrava a festa de Huitzilopochtli: os conquistadores trespassaram os corpos dos índios com golpes de lança e de espada. Motecuzoma II tentou apaziguar os ânimos astecas, apelando à não-resistência, mas a sua atitude de hesitação foi rejeitada pelos seus capitães: cansados com a atitude demasiado fraca do seu soberano, os astecas deixaram de acreditar na natureza divina dos conquistadores e sublevaram-se contra os espanhóis. O regresso de Cortez não foi suficiente para restabelecer a ordem: Motecuzoma II tentou a pedido de Cortez apaziguar os espíritos, mas acabou por ser atingido mortalmente por pedras. Com a sua morte, o tempo deixou de ser de hesitações e de ilusões divinas. A 30 de Junho de 1520 os espanhóis e os tlaxcaltecas foram atacados por todos os lados e massacrados: poucos foram os que conseguiram fugir com vida da cidade do México. Os espanhóis chamaram-lhe a Noche triste, a noite triste durante a qual Cortez, em fuga, veria os seus homens massacrados: o que lhes valeu foi o apoio prestado pelos otomi da região de Teotihuacán e pelos tlaxcaltecas, cuja capital Tlaxcala se tornou o seu refúgio e, mais tarde, a sua base de operações. O infeliz pretendente ao trono de Texcoco, Ixtlilxochitl, aliou-se aos conquistadores e às restantes tribos da região sul do lago. Graças à ajuda dos aliados nativos, Cortez conseguiu isolar a cidade do México, ao mesmo tempo que varria o lago com o fogo dos seus canhões: a fome e a falta de água potável abateram a cidade sitiada e devastada pela epidemia de varíola trazida de Cuba por um escravo negro. O sucessor de Motecuzoma II, Cuitlahuac, que reinou apenas 80 dias, foi vitimado pela varíola. O último soberano asteca foi Cuauhtemotzin, cujo nome significa "a águia que tomba", isto é, o sol poente. O seu heroísmo não foi suficiente para resistir aos assaltos dos conquistadores e dos seus aliados indígenas: as muralhas da cidade foram abatidas pelos canhões e os invasores avançaram entre as ruínas, entulhando os belos canais com os seus escombros. Cuauhtemotzin rendeu-se a Cortez no dia 13 de Agosto de 1521, tendo sido aprisionado e torturado. Embora o dia 13 - dia "um-serpente" - fosse um dia favorável, o ano 1521 - um ano "3-Casa" - era um signo nefasto. Com a rendição do seu último soberano, o Império asteca desapareceu e o mundo ficou mais pobre.

Apesar de ser brilhante, pelo menos em termos de desenvolvimento cultural, a civilização asteca era demasiado frágil, tendo dominado o território mexicano durante 93 anos entre o advento de Itzcoatl e a rendição de Cuauhtemotzin, o seu último governante. O desmoronamento brutal do Estado asteca surpreendeu os seus contemporâneos e continua a surpreender-nos: o colapso de uma grande civilização angustia todos os mortais minimamente inteligentes e sadios, sobretudo quando os vencedores tudo fizeram para apagar a sua memória, queimando os seus documentos - os textos indígenas - nas fogueiras da Santa Inquisição (sic) e destruindo os seus monumentos. No entanto, podemos explicá-lo por um conjunto de causas que passarei a identificar sem, no entanto, privilegiar uma ordem de relevância. O confronto entre espanhóis e astecas foi basicamente um confronto de dois mundos completamente diferentes: de um lado, o mundo cristão dos espanhóis, crentes na Providência - um Deus Único - e preparados para a guerra total pela empresa da Reconquista, e, de outro lado, o mundo pagão dos astecas, responsáveis por um universo sempre-já condenado, eternamente arrastados pelo seu próprio pensamento religioso e cosmológico a derramarem sangue, sempre cada vez mais sangue humano para apaziguar a ira dos deuses. Daí que, para os astecas, o bem indispensável à vida não fosse o ouro, como sucedia com os espanhóis, mas sim a pedra verde, chalchihuitl, que simbolizava a "água preciosa", o sangue humano. Visto a esta distância temporal, o choque entre estes dois mundos - alheios um ao outro - revela que o mundo dos espanhóis era mais materialista e intolerante do que o mundo dos astecas. Para escapar às fogueiras da Inquisição, os códices, com excepção de um ou de outro códice nativo, tiveram de ceder à sua intolerância religiosa, apresentando a conquista do México como uma conquista das almas para Deus e projectando os fantasmas espanhóis sobre o nobre povo asteca: Sahagún que procurou compreender os índios - fazendo uma ou outra concessão ao tribunal da Inquisição, para que o seu testemunho não fosse eliminado - começa todos os capítulos da sua obra com estas tristes palavras: «Oh infeliz nação», enganada pelo demónio e sujeita aos seus ídolos. O primeiro impulso dos conquistadores foi destruir todos os ídolos astecas - os seus deuses - e substituí-los pela Virgem de Vera Cruz, que, logo no dia seguinte, depois de ser adoptada pelos astecas, se encontrava salpicada de sangue humano. O politeísmo ilimitado dos astecas permitia-lhes adoptar novos deuses, até mesmo deuses estrangeiros, dando-lhes a possibilidade de oferecer cada vez mais sangue humano para adiar o colapso do seu mundo instável. Inscrito na sua brilhante mitologia, em especial na narrativa dos quatro Sóis que implicava a ideia de que o quinto Sol - o nosso mundo, o dos astecas e ainda o nosso - estaria tão condenado como os anteriores, o destino trágico dos astecas e do seu império foi acelerado por outros factores que decorrem - eles próprios - da própria instabilidade do mundo. Se, no fabuloso tempo dos começos, os deuses se sacrificaram para dar existência ao mundo, agora esse encargo deveria ser assumido pelos próprios homens, especialmente pelos homens astecas. O sacrifício dos deuses não foi suficiente para garantir a estabilidade do mundo: o imobilismo é uma ideia estranha ao universo noológico asteca, porque, como o sacrifício dos deuses não bastou, será preciso renová-lo eternamente. Daí que o sacrifício humano se tenha tornado uma necessidade absoluta, a necessidade de alimentar constantemente o Sol, porque, sem ele, o mundo cessaria de existir: o sangue humano era o único sangue digno de substituir o sangue divino.

  1. Em primeiro lugar, temos as causas militares: Apesar do seu reduzido número, os espanhóis dispunham de uma superioridade esmagadora sobre os astecas em termos de armamento. O ouro - a idolatria do bezerro de ouro - era a única política de Cortez quando partiu para a conquista da cidade do México, e, para se apoderarem desse metal precioso e enviá-lo para a corte de Carlos V, os espanhóis dispunham de armas e couraças de ferro, arcabuzes e canhões, caravelas e cavalos. Privados desse armamento sofisticado, os guerreiros astecas - formados na guerra florida - lutavam armados com espadas de obsidiana, arcos e flechas com pontas de sílex, escudos redondos e capacetes de materiais leves, geralmente de madeira ou de junco, e túnicas estofadas de algodão, deslocando-se a pé ou de canoa. Não admira que os astecas tenham ficado intimidados quando avistaram pela primeira vez estes estranhos forasteiros que julgaram ser enviados pelos deuses para retomar o trono que pertencia a Quetzalcoatl. Os astecas já tinham conhecimento do descobrimento e da rápida destruição das Antilhas em 1492, quer através do testemunho dos mercadores, dos cobradores de impostos, dos espiões ou das guarnições avançadas, quer através da experiência de avistar ao largo das costas «montes que flutuavam» e que naufragavam. Mas, quando finalmente conheceram os espanhóis, ficaram aterrorizados com a sua aparência, os barcos que traziam, os cães «enormes com olhos que espalhavam fogo» e com os canhões. Os supostos «seres divinos» andavam «escarranchados sobre os seus veados; assim escarranchados marchavam ao nível dos telhados e por todos os lados os corpos deles estavam envolvidos, só se lhes via aparecer a cara. Esta era branca, como se fosse cal... tinham cabelos louros, se bem que alguns o tivessem negros. A sua marcha inspirava terror a todos: eram aterradores, eram horríveis». A leveza dos guerreiros astecas contrastava fortemente com o pesado fardo carregado pelos espanhóis.
  2. Em segundo lugar, e esta é a principal razão do triunfo dos conquistadores, os astecas e os espanhóis não faziam o mesmo tipo de guerra: os espanhóis matavam os seus inimigos indígenas, tal como já tinham feito com os mouros, enquanto os astecas procuravam capturar os soldados espanhóis para depois os sacrificar. Como vimos, materialmente, os astecas lutavam com meios diferentes, muito mais leves do que os usados pelos espanhóis, e, no domínio social e moral, não encaravam a guerra da mesma maneira: «Ao ataque imprevisto, vindo de outro mundo, os (astecas) só puderam opor uma resposta absolutamente inadequada, tal como fariam os homens de hoje diante de uma invasão de marcianos» (J. Soustelle). Para os astecas, a guerra sagrada ou política encerrava-se numa rede de convenções, iniciando-se com conversações e terminando com negociações. O vencedor, favorito e instrumento dos deuses, tem todos os direitos, podendo aniquilar a cidade conquistada, deportar os seus habitantes ou massacrá-los e destruir o seu templo. No entanto, ele renuncia a esse direito total a troco de uma compensação: o tributo, pagamento pelo qual o vencido compra a sua existência, reconhecendo a supremacia de Uitzilopochtli e a de Tenochtitlán. Em troca desse reconhecimento, o vencedor asteca conserva as suas instituições, os seus ritos, os seus costumes e a sua linguagem, não sendo o império nada mais do que uma Liga de Cidades Autónomas. Os únicos soberanos indígenas que tentaram suprimir os Estados, destruindo a dinastia de Texcoco e o seu reino, foram o tirano de Azcapotzalco, Tezozomoc, e o seu filho, Maxtlaton, cuja lembrança era reprovada pelos índios do século XVI. Em 1428, os soberanos de Tenochtitlán e de Texcoco conseguiram abolir essa tirania, chamando para junto de si, a fim de partilhar com eles a hegemonia, uma cidade pertencente à tribo vencida, a cidade de Tlacopán. Deste modo, formou-se a Tripla Aliança, um pacto de aliança entre tribos irmãs, com a mesma origem e a mesma cultura, que, no reinado de Motecuzoma I e por iniciativa de Tlacaelle, selaram a Guerra Florida, cuja finalidade era apenas a de fazer prisioneiros nas lutas com as cidades de Tlaxcala e de Huexotzinco. Ora, a guerra florida foi duplamente responsável pela derrota dos astecas na luta contra os espanhóis: pela oposição entre a atitude dos dois exércitos e pela lassidão que contagiou os exércitos de Tlaxcala e de Huexotzinco, cansados de serem vencidos pelo poder asteca e dizimados pelos seus sacrifícios humanos. A guerra total empreendida pelos espanhóis não foi compreendida com suficiente presteza pelos guerreiros astecas: matar os prisioneiros no campo de batalha era uma prática estranha ao seu universo. Os invasores espanhóis não só violavam as regras tradicionais da guerra, tal como eram observadas pelos astecas, como também tentavam matar o maior número possível de guerreiros no campo de batalha. Em vez de negociar antes do conflito, os espanhóis faziam discursos pacíficos para depois massacrar subitamente os nobres astecas reunidos na praça da dança, situada no pátio do templo de Uitzilopochtli. Em vez de tentar fazer prisioneiros, os espanhóis matavam os inimigos no campo de batalha, enquanto os guerreiros astecas perdiam tempo a capturar soldados espanhóis e colaboradores indígenas para oferecê-los em sacrifício. Os espanhóis faziam uma guerra total, servindo dogmaticamente um só Estado - a monarquia de Carlos V - e uma só religião - o cristianismo, enquanto os astecas continuavam a fazer uma guerra florida, baseados numa tradição pluralista da ordem política e da ordem religiosa. Além disso, quando terminava um conflito, os espanhóis não discutiam com os astecas o montante do tributo a ser pago aos vencedores: a lógica espanhola era a lógica da conquista e não a lógica do tributo. O resultado fatal desta lógica da conquista foi o colapso total da civilização asteca: a destruição dos seus deuses e das suas crenças, a aniquilação das suas instituições políticas, a tortura infligida aos seus soberanos para lhes roubar os tesouros e o ferro em brasa da escravidão.
  3. A terceira razão prende-se com a epidemia de varíola que ocorreu na cidade sitiada pelas forças militares chefiadas por Cortez. A conquista espanhola dos vastos impérios asteca e inca foi facilitada pelo facto deles trazerem consigo, sem o saber, os germes de doenças que transformaram a sua conquista numa espécie de genocídio. O primeiro drama foi a invasão da varíola que se declarou em Hispânia em 1515, onde os indígenas sofreram pesadas baixas. O exército de reforço que Cortez desembarcou no México em 1520 levou-a com ele, transportada por um escravo negro do capitão Porfírio de Narvaez. Quando os astecas se livraram da ilusão divina para combater os espanhóis, a epidemia de varíola invadiu a cidade sitiada pelo exército de Cortez, semeando a morte entre os defensores e matando Cuitlahuac, o sucessor de Motecuzoma II: o desespero dos astecas diminuiu a sua combatividade. O facto da doença poupar os brancos foi usado para provar que os astecas tinham sido abandonados pelos seus deuses e que o Deus dos cristãos - sendo mais poderoso do que os deuses astecas - protegia os invasores. A partir do México a varíola invadiu a Guatemala e, em 1525, alcançou o Império Inca, muito tempo antes da chegada de Pizarro. A população do México em 1568 não era muito superior a três milhões de almas, mas, depois dessa epidemia, em 1620, ficou reduzida dramaticamente a um milhão e seiscentas mil pessoas. Bartolomeu de las Casas legou-nos a longa descrição das atrocidades cometidas pelos espanhóis sobre os índios, dando especial atenção à sua redução à escravatura.
  4. O facto religioso desempenhou um papel fundamental a favor dos espanhóis. Motecuzoma II julgou ter diante de si Quetzalcoatl de regresso ao México. Segundo a profecia, Quetzalcoatl prometera, ao deixar Tula, que voltaria num ano Ce-Acatl, "uma-cana", para reclamar o reino que lhe pertencia. Zelador de uma espiritualidade maior, de um verdadeiro humanismo, Quetzalcoatl tinha sido expulso por Tezcatlipoca, padroeiro dos guerreiros e dos sacrifícios, que empurrava a tribo para conquistas em terras cada vez mais afastadas e para rituais cada vez mais cruéis. A profecia de Quetzalcoatl ajuda a compreender a ambiguidade da conduta de Motecuzoma II: a sua hesitação em acreditar que os espanhóis fossem deuses e que Cortez fosse Quetzalcoatl, caso em que teria de renunciar ao seu reino e restituí-lo aos «conquistadores». Ora, dez anos antes da chegada dos espanhóis, o reinado de Motezucoma II tinha assistido a um número considerável de presságios que anunciavam o fim deste mundo, o primeiro dos quais foi o aparecimento de um enorme cometa de fogo durante muitas noites no céu: «Todas as pessoas gritavam e estavam assustadas; todos suspeitavam de que se tratava do sinal duma grande infelicidade». Gerou-se logo a seguir um incêndio no templo de Xiuhtecuhtli, sem trovão nem tempestade, e um cometa que se parecia com três estrelas atravessou o céu de ocidente para oriente. Sobre a laguna do México caiu uma tempestade gigantesca, e a água ergueu-se invadindo casas, sem que houvesse qualquer vento. Uma voz de mulher fez-se ouvir na terrível noite: «Oh meus filhos, estamos perdidos! Oh meus filhos, onde vos irei levar?» Porém, o sétimo sinal foi mais estranho do que os anteriores: uns caçadores capturaram na lagoa uma ave que tinha no meio da cabeça um espelho redondo em que se viam o céu e as estrelas. Quando a mostraram a Motecuzoma II, ele viu «uma multidão que estava completamente armada, com pessoas montadas em veados (cavalos)». Motecuzoma II pediu aos adivinhos que decifrassem o significado destes presságios, mas nesse preciso momento a ave desapareceu e alguns áugures foram sacrificados. Por fim, Motecuzoma II viu surgir diante de si criaturas monstruosas, como homens com duas cabeças ou dois homens ligados num só corpo (oitavo prodígio). Todos estes estranhos acontecimentos tinham uma conotação trágica e angustiante, na base da qual se encontrava a ideia de um contrato assinado entre os deuses e os homens: o descontentamento dos deuses podia mergulhar o mundo instável dos astecas nas trevas e, para adiar esse desfecho fatal, o número de homens sacrificados aumentou significativamente durante este período, de modo a alimentar os deuses com o seu sangue. Embora condenassem os sacrifícios humanos e a prática do canibalismo, os espanhóis souberam usar em proveito próprio a sua reputação divina. Díaz del Castillo conta que os espanhóis enterraram os seus cavalos «para que (os astecas) não vissem que éramos mortais». Ora, a morte do primeiro espanhol e a morte do primeiro cavalo - cuja cabeça foi colocada no tzompantli - marcaram o aparecimento das primeiras dúvidas entre os seguidores de Quetzalcoatl quanto à natureza divina dos conquistadores. Mas foi preciso esperar pelo grande massacre do templo, pelos combates de Junho e pela morte do imperador para que a vontade de resistência dos astecas se encarnasse na figura de Cuauhtemotzin. Porém, quando os astecas se libertaram da ilusão divina, já era demasiado tarde, até porque os espanhóis contavam com a ajuda - homens e recursos - de diversas tribos indígenas, cujos membros temiam - segundo Díaz del Castillo - ser comidos. Além desta psicose do terror ou deste pânico de ser comido, há, no entanto, um episódio digno de ser recordado: a alegria exibida pelos espanhóis perante o ouro mostrou aos astecas que eles eram mortais: «Grande foi a sua alegria, ficaram encantados (quando Motecuzoma II lhes enviou presentes). Como se fossem macacos, erguiam o ouro às mãos cheias, depois sentavam-se frementes de prazer... provavelmente respiravam-no com uma sede furiosa. Os corpos deles dilatavam-se nesta busca, tinham uma fome frenética. Como certos esfaimados, agarravam-se ao ouro com furor».
  5. Finalmente, temos as causas políticas. É um facto incontornável que a inteligência maquiavélica de Cortez desempenhou um papel crucial na conquista do México. Cortez era não só um grande estratega militar, como também um grande político e um grande diplomata. Díaz del Castillo retratou-o nestes termos quando Cortez prosseguia na marcha triunfal para a capital do México: «Estava abençoado pelo Céu e conseguia levar a bom termo tudo o que empreendia, especialmente a pacificação». Com efeito, a diplomacia de Cortez, o seu sentido das relações de forças e a sua habilidade política faziam tender em seu proveito os rancores e as ambições dos indígenas contra a capital asteca. Cortez compreendeu desde o início que o império asteca não lhe opunha uma frente unida: os povos dominados por Motezucoma II estavam cansados de entregar a sua riqueza ao soberano e os filhos aos deuses astecas. O pânico de ser comido de que fala Díaz del Castillo é descrito pelo Conquistador Anónimo, soldado e não frade, nestes termos: «Todos os habitantes desta província do Nordeste e igualmente os das províncias em redor comem carne humana, e interessam-se mais por ela do que por outro alimento qualquer, a tal ponto, que muitas vezes vão para a guerra e põem a vida em perigo só para matar alguém que possam comer». Ciente deste ódio que os indígenas nutriam pelo império asteca, Cortez soube, em nome da pacificação, fazer duas diplomacias paralelas, uma com os astecas e o seu imperador Motezucoma II e outra com os seus aliados indígenas, ao mesmo tempo que executava o seu plano estratégico de conquista. Na segunda Carta dirigida a Carlos V, Cortez deixa transparecer a natureza da sua diplomacia: «Disseram-me (os habitantes de Cempoala) que queriam ser vassalos de Vossa Majestade, e seus amigos, e que me pediam para os defender do grande senhor que os governava à força e com tirania, e que ficava com os filhos deles para os matar e os sacrificar aos seus ídolos». Apesar da ambiguidade da sua conduta em relação aos espanhóis, Motezucoma II tentou mais de uma vez dissuadi-los de entrar na cidade do México, enviando múltiplas embaixadas, algumas das quais imbuídas de "más" intenções. O Codex Ramírez conta que Cuitlahuac aconselhou o imperador a não acolher os espanhóis, dizendo-lhe: «Oxalá os nossos deuses não permitam que deixeis entrar os que vos expulsarão e vos tomarão o vosso reino, e quando quiserdes remediar o mal, será tarde». Estas palavras proféticas de Cuitlahuac não foram escutadas por Motezucoma II, que, apesar da sua inquietação, decidiu receber, albergar e festejar os espanhóis. Díaz del Castillo resume assim a intenção "oculta" do imperador: «Motecuzoma pedira o conselho do seu Huichilobos, dos seus papas e capitães e todos o aconselharam a deixarem-nos entrar na cidade para que os matássemos todos à vontade». Os códices não permitem apurar a verdade deste enunciado de Díaz del Castillo: o que sabemos ao certo é que foram os sucessores de Motezucoma II que protagonizaram a resistência contra a conquista espanhola. Os povos de Tlaxcala e de outras cidades que se aliaram aos espanhóis na conquista da cidade do México, pensavam que se tratava de mais um episódio na luta entre Estados combatentes, uma luta em tudo semelhante à luta que tinha derrubado a tirania de Azcapotzalco. O que eles não compreenderam na altura é que a queda do império asteca arrastaria as suas próprias cidades, trazendo a destruição da sua religião e a ruína da sua cultura. A guerra total levada a cabo pelos espanhóis, com a ajuda dos seus colaboradores indígenas, visava unicamente destruir a religião indígena em proveito da sua própria religião, e eliminar o Estado asteca em proveito do seu soberano Carlos V: o que movia os espanhóis não era o desejo de cobrar impostos aos vencidos, mas sim a vontade de apoderar-se de todas as suas riquezas e de reduzi-los à escravatura. 

Bibliografia sumária:

  • Codex de 1576. Paris: Leroux, 1893.
  • Cortez, Fernando (1971). Cartas de Relación. México: Editorial Porrua.
  • Díaz del Castillo, Bernal (1955). Historia verdadera de la conquista de la Nueva España. Buenos Aires: Espasa-Calpe.
  • Sahagún, Frei Bernardino de (1956). História general de las cosas de la Nueva España. México: Editorial Porrua.
  • Sahagún, Frei Bernardino de (1959). Florentine Codex. Santa Fé, New Mexico: School of American Research and the University Utah.

J Francisco Saraiva de Sousa

20 comentários:

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

O objecto deste texto é explicar a vitória dos espanhóis sobre os astecas. Ah, e não esqueci o texto anterior.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Amanhã vou tentar concluir o texto anterior e avançar mais este texto sobre o México. Suporto bem stress cognitivo, sobretudo quando o afastamento aproxima: há algo comum aos 2 textos. A brincar, direi que é a profecia Maia do fim do mundo a 21 de Dezembro de 2012! Eheeeheee... é a filosofia do tempo. :)

Simão disse...

Muito interessante! Estou aguardando o texto da profecia Maia do fim do mundo... É verdade, o mundo está sempre acabando. Como não entendo nada desse assunto fascinante, gostei muito do filme "Apocalypto" do famigerado Mel Gibson. Vi também "A Fonte da Vida", de Darren Aronofsky que tinha uma cena muito bonita com um guerreiro Maia todo paramentado, mas esse filme era muito inteligente para um sujeito simples como eu. Seja como for, acho que vou gostar de suas férias mexicanas. Grande abraço!

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Olá Zekzander

Então, vou tentar concluir ou, pelo menos, avançar mais - este texto. Preciso de inspiração para traduzir bem os discursos do imperador asteca. Estive a pensar e decidi descrever a guerra e, depois, identificar as causas da queda uma a uma, de modo a explicitar um pouco a história dos astecas, os 93 anos do seu domínio local.

Os portugueses também travaram diversas guerras, algumas das quais já referi num post sobre Moçambique. Além disso, temos as guerras ligadas ao Império do Oriente - com centro na Índia-Goa. Porém, os documentos portugueses são proibitivamente caros, a menos que sejam consultados numa biblioteca.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Ah, falei do preço proibitivo dos livros portugueses porque sou preguiçoso: os documentos astecas tenho em casa e posso riscá-los de modo a orientar-me.

Darla Medeiros disse...

Minha paixão por História perdida em suas linhas... Parabéns...

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Está concluído!

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Bem, depois de ter concluído O Choque dos dois Mundos..., recebi como prémio mais alguns livros sobre os astecas. Agora querem que me dedique à Cidade do Porto. Porém, antes do Porto, vacilo entre Palenque, cidade da civilização Maia, e a queda do Império Inca. Ainda não decidi...

Simão disse...

Parabéns! Estou sentindo inveja...
Abusando da sua gentileza: se tiver tempo, escreva alguma coisa sobre a "economia" asteca. O que foi aquilo lá? Era uma sociedade escravista, um feudalismo diferente, modo de produção asiático? Você falou que Montezuma mandou umas escravas para Cortez... Novamente, desculpe o abuso... A cidade do Porto bem merece sua atenção, mas Palenque também! Grande abraço!

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Sim, as sociedades maia e asteca eram sociedade classistas: quatro classes, nobreza, povo e escravos, os comerciantes no caso asteca e os sacerdotes no caso maia. Os escravos eram prisioneiros de guerra, criminosos ou pessoas endividadas que precisavam de vender-se para saldar as suas dívidas. Porém, abstraindo dos prisioneiros que eram sacrificados, os escravos não eram maltratados. As economias eram basicamente agrícolas. É difícil aplicar as noções de modo de produção asiático ou mesmo feudal. Traços dos 2 coexistem: eram sociedades hierarquizadas, mas plurais. A capital do México cobrava impostos às outras cidades mas respeitava a sua autonomia. Reconheço ser necessário pensar as economias destas sociedades.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

O chamado povo integrava os artesãos e os camponeses.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Não havendo escravidão ou servidão é difícil falar de esclavagismo ou de feudalismo. Mas há mais: o título de nobreza não era entre os astecas hereditários e os imperadores eram eleitos. Entre os maias, podemos distinguir uma divisão entre nobres e sacerdotes, mas entre os astecas essa distinção era menos evidente: os guerreiros tinham funções sacerdotais. A classe sacerdotal nunca se autonomizou da nobreza guerreira.

Outro aspecto: a cultura mais faz lembrar as cidades-estados de Atenas e Esparta. Durante um longo período, houve uma aliança entre cidades-estados maias. Este pluralismo da ordem política tb se encontra no território mexicano...

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Outro aspecto curioso da sociedade asteca: a (digamos) escola da elite não estava fechada aos membros do povo, recebendo-os e dando-lhes formação superior. Há uma certa forma de democracia na sociedade asteca. O império asteca dividia-se em províncias, cada uma das quais pagava impostos - cobrados 4 vezes por ano por um enviado do imperador. A tripla aliança era uma aliança entre três cidades com a mesma origem que celebraram a guerra florida. Porém, as outras cidades eram autónomas. O caso mais burocrático é o império inca - excessivamente burocrático.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Um facto que não referi no texto: antes da conquista, o exército asteca tinha sido humilhado pelo exército de Tlaxcala, a cidade que depois se aliou a Cortez. Motezucoma nunca suportou esta humilhação. Porém, chegou a enviar embaixadas a Tlaxcala para conspirar contra uma cidade aliada, Texcoco. Nunca saberemos como o império iria desenvolver-se...

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Esta derrota com Tlaxcala levou os astecas a fazer captura de prisioneiros em cidades próximas, gerando muita angústia. Tlaxcala ficava a 120 Km da capital asteca, salvo erro.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Ah, Doña Marina era uma nobre asteca feita escrava pelos maias de Tabasco: as 20 escravas foram oferecidas por este grupo maia, daí o ódio de Doña Marina em relação aos maias.

Simão disse...

Agradeço a minuciosa resposta. Por aqui, alguns livros didáticos classificam os Astecas no m.p. asiático, mas suas ponderações sinalizam que a coisa é bem mais complicada... Melhor assim! Novamente obrigado!

Jair Sueki disse...

Não seria anacronismo aplicar conceitos como feudalismo e classes em sociedade com temporalidades, espacialidades e conceitos completamente difentes da Europa?

Unknown disse...

Não tem como resumir

Unknown disse...

Não tem como resumir